Cenário de destruição em Vila Felipe, onde moradores desapareceram ao tentar ajudar vizinhosCenário de destruição em Vila Felipe, onde moradores desapareceram ao tentar ajudar vizinhos Foto: Fabiano Rocha / Agência O Globo
Por volta das 18h30 de terça-feira, os moradores de Vila Felipe, região de Alto da Serra, em Petrópolis, ouviram o primeiro "estrondo", nas palavras do autônomo Silva Moreira Filho, de 42 anos. Era a primeira avalanche causada pelo temporal naquela encosta — toneladas de terra movediça que devastaram trechos de mata fechada e reduziram casas, árvores e postes a um amontoado de destroços. Enquanto os moradores corriam para tentar se salvar, o sogro de Silva, José Rubens Silveira, de 48 anos, correu para ajudar um vizinho a se levantar em meio aos escombros. O homem socorrido conseguiu se desvencilhar e sobreviveu. Instantes depois, porém, veio o "segundo estrondo", e Rubens nunca mais foi visto.
— Muita gente perdeu a casa, mas conseguiu se salvar. A casa do Rubens ficou de pé, mas ele sumiu — destaca Renan Soares, de 36 anos, outro habitante do local.
Rubens é um dos desaparecidos da Vila Felipe, localidade próxima ao Morro da Oficina, a mais afetada pelo temporal que matou pelo menos 100 pessoas na cidade da Região Serrana. Segundo relatos, outro morador da região, cujo apelido era Carlinhos, também desapareceu ao tentar ajudar os vizinhos.
Em busca de informações sobre o sogro, Silva, que mora num bairro distante, foi a primeira pessoa a chegar ao local nesta quinta-feira após as equipes de resgate, por volta das 6h, após uma longa caminhada pelas ruas arrasadas de Petrópolis. Nas horas seguintes, outros moradores e parentes de desaparecidos apareceram para tentar visualizar o trabalho dos bombeiros.
— A mulher dele conseguiu sair por uma das portas da casa. Ele tentou sair pelo outro lado e não conseguiu. Desde então não o vi mais. Já minha sogra está abrigada num colégio aqui perto — conta Silva.
Habitantes estimam que no mínimo 30 casas tenham sido parcial ou totalmente atingidas pelos deslizamentos de terça-feira. Os bombeiros acreditam que pelo menos 12 pessoas foram soterradas na região, das quais quatro foram encontradas entre a tarde e a noite desta quarta-feira — três mortas, uma com vida.
Nos últimos dois dias, as equipes de resgate têm revirado as ruínas da Vila Felipe com a ajuda dos próprios moradores. Para facilitar o trabalho dos bombeiros, habitantes improvisaram passagens por sobre a lama profunda com restos das casas que existiam ali: portas, vigas, telhas, entre outros. Aqueles que perderam as casas estão abrigados numa escola próxima, Colégio Rui Barbosa.
— Preciso agradecer a todo mundo que se ajudou na hora do "pega pra capar". A rapazeada ajudou muito — diz o aerofotogrametrista Valdenir Dias Lopes, de 67 anos.
Valdenir perdeu a casa na avalanche. Ele também está à procura de sua sobrinha, Bernardete Sorgini Cortesi, de 27 anos, e a mãe dela, sua concunhada, Olga Cortesi, de 61.
— É doloroso. A gente vê na televisão a desgraça dos outros, mas quando a gente sente na pele, a gente vê que é dose. Você tem tudo agora, e dez minutos depois você não tem mais — desabafa Valdenir.
No semblante dos familiares de pessoas desaparecidas, o desespero é evidente. Fortemente emocionado, Renan Soares, que também teve a casa levada pelas chuvas, não contou sua história por inteiro. Com os olhos rasos de lágrimas, conseguiu apenas listar os nomes de seus quatro familiares desaparecidos: Renata Soares, de 34 anos, irmã; Fernanda Soares, 40, irmã; Monique Soares, 18, sobrinha; Gabriel Soares, 20, sobrinho.
— E pensar que isso aconteceu outras vezes e ninguém fez nada. Esse bairro está condenado. Esses deslizamentos não foram por causa de lixo que a população jogou. É má administração da prefeitura — acrescenta Valdenir.
Deixe sua opinião