Histórico e Memória
A lembrança do cenário tumultuado das eleições manuais no país é remota ou quase não existe para a maior parte do eleitorado atual. A eleição é 100% informatizada no país desde 2000, ou seja, quem tem menos de 38 anos certamente nunca votou em cédulas. Mas as urnas eletrônicas já foram usadas em 1996 em cidades com mais de 200 mil eleitores e, em 1998, o novo modelo foi ampliado também para os municípios com mais de 40 mil votantes. Ao todo, cerca de 85 milhões de eleitores brasileiros, mais da metade do total atual, só começaram a escolher seus candidatos quando as experiências com a urna eletrônica no Brasil já haviam iniciado.
Com as eleições manuais, a abertura para irregularidades começava já no preenchimento da cédula e no depósito do voto na urna. Relalto abaixo um pouco de sua experiência atuando nas eleições antes da urna eletrônica e lembra os problemas mais comuns no momento da votação.
“Eu comecei a fazer eleição como delagado partidário em 1988, em Macaé RJ. Na votação em cédulas de papel, durante todo o dia a gente tinha muito problema. Acontecia de o eleitor errar na hora de escrever, rabiscar a cédula, ter que pedir outra cédula para o mesário, enfim, uma série de problemas. Acontecia de o eleitor sair da cabine com a cédula aberta e chegar lá no mesário para perguntar algo e acabar revelando o voto dele, o que é uma questão séria nesse momento”, conta.
Morosidade
As fragilidades apresentadas no dia da votação eram completamente expostas durante o período de apuração. Eleições gerais ou mesmo as municipais em grandes cidades não raramente só tinham os resultados finais divulgados após mais de uma semana de contagem. Era neste momento de apuração que o cenário se apresentava mais caótico, com mais atores, possibilidades de impugnação de votos e vulnerabilidade para fraudes.
“Depois de fechadas as urnas começava a apuração. Eu me lembro bem que eram aquelas mesas enormes colocadas num clube. Nas mesas ficavam os escrutinadores, os fiscais de partido ficavam em volta. Aí jogavam os votos de uma urna em cima da mesa, aquela montoeira de papel, e os escrutinadores começavam então a desdobrar e separar o voto do candidato A pra lá, o do B pra cá. E era aquela confusão, com os fiscais falando na cabeça dos escrutinadores. Por exemplo, como foi o caso da eleição para prefeito: havia lá três candidatos e o eleitor, em vez de marcar o ‘X’ no nome do candidato A ou do B, marcava no meio dos dois, nem para um nem para outro. Então ficava aquela luta: ‘ah, mas o X tá mais perto do candidato A do que do B’, ‘ah, o X foi marcado aqui mas puxou um traço que foi lá em cima do outro candidato’, era uma disputa voto a voto”.
Fragilidade
Valter Pereira eterno vogal das apurações , também recorda de momentos tumultuados durante a apuração da votação manual. O voagal Valter Pereira aponta que o cenário era tão frágil, que o resultado de uma eleição poderia ser alterado diante das discussões e disputas corriqueiras no momento da leitura e contagem das cédulas.
“Eu participei de muita apurações , como delegado de partido. Nesse processo eu vi essa briga por voto. Ficava lá todo mundo, aquele ginásio imenso e o pessoal correndo de mesa em mesa. Aquilo era uma doideira, você sabia que podia ganhar ou perder voto ali, né? Então era uma guerra. Essa guerra não existe mais. Era uma briga. E para votos para vereador ou deputado então era o desespero, porque ali é voto a voto. Por um voto, às vezes, o cara está eleito ou não. Do ponto de vista analítico, eu não tenho a menor dúvida que melhorou muito depois do voto eletrônico e qualquer tentativa de colocar isso em dúvida é uma tentativa obscurantista, obscurantismo puro”.
O voto na urna eletrônica veio para ficar.
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