Com articulação do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), líderes do Centrão tentam incluir novamente a quarentena de cinco anos para juízes e membros do Ministério Público no texto do novo Código Eleitoral.
Para valer, no entanto, a medida precisa ser aprovada pela Câmara e pelo Senado e sancionada pelo presidente Jair Bolsonaro. A articulação foi discutida nesta terça-feira (14) e a votação na Câmara deverá ser concluída nesta quarta (15).
A proposta para instituir a quarentena eleitoral para juízes e integrantes do Ministério Público foi derrubada por três votos na última quinta-feira (9): foram 254 votos a favor da medida, eram necessários ao menos 257.
Por causa disso, líderes partidários argumentaram que seria incoerente manter a restrição para militares e policiais ao mesmo tempo em que era liberada a candidaturas de magistrados. Todas as quarentenas acabaram caindo, por consequência.
A quarentena visa evitar a politização da categoria. A proposta inicial no código eleitoral era de que vigorasse já para as eleições de 2022, mas a resistência de partidos de centro-direita criou uma regra para que fosse implementada apenas a partir de 2026. A emenda aglutinativa inicialmente também previa a entrada em vigor a partir de 2022, mas os deputados mudaram e decidiram que, se aprovada, valerá apenas a partir de 2026.
A manobra desta terça, porém, prevê apenas a retomada da medida restritiva para juízes e membros do Ministério Público.
O centrão, que comanda hoje a Câmara, foi um dos principais alvos da Operação Lava Jato. Os deputados acusam o ex-juiz e ex-ministro da Justiça Sergio Moro, cujo nome é apontado como pré-candidato à Presidência, de usar o cargo para se promover politicamente.
A tentativa de devolver a quarentena eleitoral ao texto passa por uma emenda aglutinativa que vai unir destaques propostas de modificação ao texto do PSDB e do Solidariedade. O texto é assinado pelo deputado Cacá Leão (PP-BA), líder do partido de Lira. Leão coletava assinaturas para apresentar a proposta.
De acordo com o texto da emenda aglutinativa, "ficam inelegíveis, nas eleições federais, estaduais e municipais, os magistrados ou membros do Ministério Público que não tenham se afastado definitivamente de seus cargos e funções até 5 (cinco) anos anteriores ao pleito".
A iniciativa lembra manobra adotada pelo ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha (MDB-RJ) em 2015, também em uma votação de reforma política. Após o plenário da Casa rejeitar a volta do financiamento privado das campanhas, Cunha quebrou um acordo político e decidiu colocar a proposta novamente em votação no dia seguinte.
A deputada Adriana Ventura (Novo-SP) critica a manobra. "Absurdo tentar resgatar a quarentena de juízes e membros do Ministério Público, que já foi rejeitada por este plenário. A matéria já está vencida e não vamos aceitar essa manobra regimental."
Já a presidente do Podemos, Renata Abreu (SP), vai apresentar uma questão de ordem argumentando que a emenda aglutinativa viola o regimento. "De início, cabe ressaltar que a emenda que previa a quarentena teve seu destaque retirado, de modo que passa a integrar o grupo de emendas já deliberadas e considerada, portanto, prejudicada", afirma.
"Assim, conforme preconiza o regimento interno da Câmara dos Deputados, que exige que a parte aglutinada não tenha sido deliberada, a emenda aglutinativa deve ser indeferida.
O texto-base do novo Código Eleitoral foi aprovado na última quinta por 378 votos a favor e 80 contrários. Esse é o principal projeto do pacote eleitoral liderado por Lira e relatado por uma de suas principais aliadas, Margarete Coelho (PP-PI).
Entre as várias modificações debatidas a toque de caixa pelos deputados e previstas no texto-base estão a censura a pesquisas eleitorais e a fragilização de normas de transparência, fiscalização e punição de políticos e partidos por mau uso das verbas públicas.
Há ainda a proposta de reduzir o poder da Justiça Eleitoral de regulamentar as eleições.
Em seus cerca de 900 artigos, o projeto estabelece censura a pesquisas eleitorais, para que elas só possam ser divulgadas até a antevéspera da eleição.
O texto determina ainda que os institutos que fazem esses levantamentos informem um percentual de acertos das pesquisas realizadas pela entidade ou empresa nas últimas cinco eleições. O dispositivo é criticado por especialistas, que lembram que as pesquisas retratam a realidade de determinado momento, não o voto dado.
Há um destaque do Cidadania, ainda não votado, que visa suprimir do projeto a censura à publicação das pesquisas eleitorais.
O Congresso já tentou por várias vezes limitar a publicação de pesquisas eleitorais. Em 2006 o Supremo Tribunal Federal considerou inconstitucional projeto aprovado que proibia a divulgação dos levantamentos nos 15 dias que antecedessem o pleito.
Antiga reclamação de parlamentares, as resoluções do Tribunal Superior Eleitoral também são afetadas pelo projeto. Os deputados aprovaram texto segundo o qual, para valer nas eleições, essas resoluções terão que ser emitidas com antecedência mínima de um ano. O Congresso passa também a ter o poder de cassar resoluções do TSE.
Os deputados também aprovaram regras mais frouxas de fiscalização, transparência e punição de partidos e candidatos que façam mau uso das verbas públicas. Só para o fundo eleitoral, por exemplo, há discussão do uso de cerca de R$ 4 bilhões de dinheiro público nas eleição de 2022.
Entre outros vários pontos, o projeto estabelece que a análise da prestação das contas partidárias deverá se restringir ao cumprimento de regras burocráticas, sendo que a devolução de verbas só ocorrerá em caso de gravidade.
A Lei da Ficha Limpa, criada para tentar banir da vida pública os políticos enrolados com a Justiça, também é fragilizada.
Na votação das emendas, caiu a medida que permitia novamente a políticos usar a manobra de renunciar para evitar a cassação (sem que isso resulte em inelegibilidade).
No início da votação dos destaques pela Câmara, foi aprovado um destaque do PSB para que o voto dado aos indígenas também seja contado em dobro no cálculo para distribuição das verbas públicas entre os partidos. No texto original, a regra valia apenas para mulheres e negros eleitos.
Durante toda a tramitação dos atuais projetos de reforma eleitoral e política, especialistas apontaram retrocessos e açodamentos na discussão de mudanças tão profundas.
Sob liderança do Movimento Transparência Partidária, foi criada a campanha "Freio na Reforma".
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