Na porta da sala onde aconteceram as humilhações, há uma inscrição 'Turma do terror'. Segundo ele, agressões são constantes, mas sempre acreditou que ia 'resolver com o diálogo'.
Uma rotina de agressões. É assim que o professor de língua portuguesa Thiago dos Santos Conceição, de 31 anos, define a rotina no Ciep Mestre Marçal, em Rio das Ostras, na Região dos Lagos do Rio de Janeiro. Imagens gravadas por um dos estudantes na última terça-feira (18) mostram diversas agressões promovidas pelos alunos quando ele tentava aplicar uma avaliação para uma turma do 9º ano. Agora, ele teme voltar às salas de aula.
“Eu desejo continuar com a minha profissão, mas temo pela minha vida”, destacou Thiago, que chora ao lembrar do episódio.
Depois do episódio, ele pediu afastamento porque não tinha condições de voltar a dar aula para os jovens. Thiago tem a consciência de que não é um caso isolado e que outros professores no Rio de Janeiro e em outros estados passam por situações semelhantes a dele.
“Eram constantes as agressões, mas a gente sempre acha que vai resolver com diálogo”, destacou o professor, que leciona há dez anos.
Thiago começou a trabalhar no Ciep em fevereiro, no começo do ano letivo. Desde o início, a rotina era de agressões verbais e de insultos. O professor chegou a procurar a direção da instituição e revelou o problema, mas, segundo ele, nenhuma providência foi tomada.
Apesar da violência, Thiago diz que sempre insistiu em usar o conhecimento para transformar a realidade em que vivem os alunos.
“Todas as minhas aulas eu falo sobre a importância do diálogo, sobre a importância da educação”, revelou Thiago, emocionado.
A gota d’água foi a aula gravada. Na porta da sala onde aconteceram as humilhações, há uma inscrição “Turma do terror”.
“Eu tenho medo, porque eu já vi ataques. Se eu não tinha medo de amanhecer morto, que era para eu tomar cuidado para não ser atropelado, que era para eu tomar cuidado para não ser atropelado, para eu tomar cuidado para não ir à escola de carro porque o pneu poderia aparecer furado. Então são diversos ataques que eu vendo sofrendo”, contou.
Desrespeito ao professor aconteceu no Ciep Mestre Marçal, em Rio das Ostras — Foto: Reprodução/ TV Globo
Os questionamentos foram respondidos com palavrões e ele chegou a sofrer ofensas racistas. Thiago decidiu não voltar mais para o Ciep onde lecionava e, mesmo depois de todas as agressões, diz que ficou uma sensação de dever incompleto.
“Hoje eu me sinto frustrado. Triste por não ter conseguido mudar aquela situação. Por não ter deixado aquele legado para os estudantes. É humilhante estar no seu trabalho e ter que renunciar a isso”, explicou.
Desejo de lecionar
A vocação para lecionar surgiu cedo e sempre foi um sonho, segundo ele. Fã de Machado de Assis, desde os tempos do ensino regular Thiago fazia parte de cursos de monitoria e ajudava alunos que tinham dificuldades com a matéria.
Assim como os estudantes que cometeram as agressões, ele também é oriundo de escola pública. Na época, segundo ele, a relação com os professores era diferente e os pais sempre estavam atentos às questões dos filhos na escola.
Atualmente, são raros os pais de estudantes que ele conhece. “Tudo era resolvido com clareza. A escola tinha um compromisso em resgatar pessoas”.
Caçula de quatro irmãos, o professor mora com a mãe na Região Metropolitana do Rio. Ela chorou e teve que tomar medicamentos depois de ver as imagens em que o filho é humilhado pelos estudantes.
Pedido de desculpas
Durante os três minutos de filmagem, os alunos ofenderam o professor, que demonstrou calma em todos os momentos.
Um dos adolescentes chegou a arremessar uma pochete na direção do professor quando ele escrevia no quadro. O professor questiona se a intenção era atingi-lo e outro aluno responde: "'Peraí' que agora vai acertar".
O aluno que aparece nas imagens arremessando o objeto gravou um vídeo pedindo desculpas a Thiago.
“Pô, mano, vim aqui falar sobre o bagulho lá da escola. Ninguém é perfeito, tá ligado. Todo mundo já teve um momento assim de criança, de fazer o bagulho no embalo. Queria pedir desculpa pelo acontecido pelo fato de ter feito o que eu fiz na sala de aula, ter tacado o objeto, não no professor, mas no quadro que quase pegou nele,” afirmou o aluno.
O estudante afirmou que agrediu o professor “no embalo” e acabou “não raciocinando”.
““Isso aí é coisa de marginal, de vacilão, entendeu? Porque a gente tá na escola para estudar, não é pra ficar debochando da cara de ninguém, especialmente do professor que não tá ali de bobeira, que está ali porque está precisando daquele dinheiro, tá fazendo aquilo por amor,” completou o aluno
A Prefeitura de Rio das Ostras afirmou que os alunos envolvidos no caso foram suspensos e estão sendo analisadas quais outras medidas socioeducativas podem ser tomadas. Segundo a direção da escola, a turma é formada por alunos que vieram transferidos de outra unidade de ensino, e muitos deles são indisciplinados. No entanto, ainda não tinham sido registrados episódios como os ocorridos nesta semana.
Ainda segundo a prefeitura da cidade da Região dos Lagos, o professor receberá todo o suporte jurídico e psicológicos necessários e que o poder municipal também tomará medidas para que o apoio aos educadores , também na área psicológica, seja ampliado.
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