TCE: 54 funcionários públicos de alto escalão receberam irregularmente o SuperaRJ
Dono de 28 carros, pessoas com registro de óbito e proprietário de aeronave também foram beneficiados no programa
TCE apontou irregularidades na concessão de benefício destinado a pessoas de baixa renda Márcia FolettoTCE apontou irregularidades na concessão de benefício destinado a pessoas de baixa rendaTCE apontou irregularidades na concessão de benefício destinado a pessoas de baixa renda Márcia Foletto
Pelo menos 54 funcionários públicos do alto escalão do Rio foram beneficiados indevidamente pelo programa SuperaRJ, do governo estadual. Entram nesse grupo vereadores, assessores parlamentares, diretores e coordenadores. É o que mostra relatório do Tribunal de Contas do Estado (TCE-RJ) de setembro passado, que apontou irregularidades em concessões do principal benefício assistencial da gestão Cláudio Castro (PL), criado durante a pandemia.
O TCE-RJ identificou que, ao todo, 485 agentes públicos estavam com cadastros ativos no sistema do programa, sendo que 132 chegaram a retirar os cartões do auxílio emergencial regional, gerando um ônus de R$ 79.020 aos cofres estaduais. A denúncia foi feita pela Folha de S. Paulo e confirmada pelo EXTRA.
Da relação de favorecidos, constam ainda funcionários vinculados à Secretaria estadual de Desenvolvimento Social e Direitos Humanos e à Secretaria estadual de Trabalho e Renda, responsáveis pela checagem e pela autorização do pagamento no âmbito do SuperaRJ.
O programa foi implementado durante a pandemia para prestar assistência a pessoas de baixa renda, que poderiam receber até R$ 380 mensais em cartões entregues pelo governo do estado. Esse valor inclui R$ 50 pagos por filho, limitado a dois filhos, além de um vale-gás.
Dono de 28 carros e barco de R$ 600 mil
No relatório de setembro passado, o TCE-RJ informou que benefício foi recebido por donos de carros e até de embarcações. Foram identificados 2.793 beneficiários do SuperaRJ que eram tinham veículos fabricados depois de 2009. Destes, 141 tinham dois ou mais automóveis, chegando ao caso extremo de um beneficiário ter, em seu nome, 28 carros produzidos depois de 2009.
"Nesse caso, é patente a falta de compatibilidade com a condição de beneficiário do auxílio emergencial de renda mínima. Tal situação suscita, inclusive, dúvida sobre a possibilidade de bens de terceiros estarem sendo registrados regularmente em nome dessas pessoas", atestou o tribunal.
Outros 186 proprietários de barcos foram beneficiados pelo SuperaRJ. Dessas embarcações, 18 estão em operação e foram adquiridas por valores a partir de R$ 30 mil. Há dois casos em que o veículo custou mais de R$ 300 mil. O beneficiário I.P.D.S. tem em seu nome uma lancha comprada em 2012 por R$ 600 mil, enquanto R.D.S.C., que também foi contemplado pelo programa, comprou uma escuna em 2010, avaliada em R$ 350 mil.
O proprietário de aeronave também foi identificado pelo TCE-RJ dentro da lista de beneficiários.
Presos e mortos entre beneficiários
A equipe fiscalizadora do TCE-RJ atestou ainda que 185 presos em regime fechado estavam com cadastros ativos no programa, sendo que 25 conseguiram retirar os cartões. Isso significa que R$ 192.560 foram liberados a pessoas privadas de liberdade, sendo R$ 32.730 em cartões retirados. A essa inconsistência, o Tribunal atribui a defasagem nas bases de dados usadas — do Ministério da Justiça e do Departamento Penitenciário Nacional (Depen).
Outras 32 pessoas com registro de óbito no Sistema de Controle de Óbitos (Sisobi), da Dataprev, também estavam entre os beneficiados pelo SuperaRJ. Um dos casos é o de R.M.N., de Magé, na Baixada Fluminense. A retirada do cartão foi registrada em 6 de dezembro de 2021, após seu falecimento. Neste caso, o TCE-RJ atesta que "nem sempre é cumprido o procedimento informado pelos gestores do SuperaRJ, segundo o qual os cartões somente são entregues para o titular".
Ainda segundo o documento, o TCE-RJ identificou que outros 1.349 beneficiários já eram contemplados em programas assistenciais de municípios, ou seja, acumulariam os valores. Destes, 382 chegaram a retirar o cartão, de acordo com o Tribunal. Caso tivessem recebido os auxílios municipais durante todo o período em que receberam o auxílio estadual, os conselheiros estimam uma retirada de R$ 664.350.
Nenhum dos valores repassados irregularmente retornou aos cofres estaduais.
Mais de 15 mil cartões furtados
Na auditoria, o TCE-RJ ainda identificou que cerca de 15,2 mil cartões do SuperaRJ foram furtados e, segundo o Tribunal, já deveriam ter sido cancelados "se o decreto tivesse sido observado" — o texto prevê que haja o cancelamento se o cartão tiver sido emitido há mais de 180 dias. Foram identificados furtos em Belford Roxo (6.107) e Nova Iguaçu (de 4 mil a 5 mil), na Baixada Fluminense. Destes, 2.423 e 4.333, respectivamente, já deveriam ter sido cancelados quando a auditoria foi feita.
Dos 4.098 cartões do SuperaRJ furtados dos Centros de Referência de Assistência Social (Cras), 2.929 deveriam ter sido cancelados por terem sido emitidos havia mais de 180 dias.
Os cartões, de acordo com o Tribunal, têm saldo que varia de R$ 280 a R$ 3.180, dependendo da quantidade de depósitos mensais e da composição familiar.
Os números levam com base apenas casos em que houve registro de ocorrência. Então, a quantidade real de cartões furtados pode ser maior.
O que diz o governo
O governo do estado afirmou que o SuperaRJ segue em reformulação constante "para que não haja divergência em sua finalidade" e que já prestou todos os esclarecimentos ao TCE-RJ. Informou ainda que "seguirá sempre junto na busca de soluções para que eventuais divergências sejam resolvidas de acordo com a lei, em benefício da população, e sem prejuízo aos cofres públicos".
O blog do Magal - Opinião e Política
Deixe sua opinião