Em carta, grupo repudia a decisão do presidente e ressalta que o título seria concedido a Marcus Lacerca e Adele Benzaken por mérito científico e não por 'injunção política'
Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)
Divulgação/UFRJ
Quarenta e quatro professores eméritos da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) protestam em carta aberta contra a atitude do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) de retirar os nomes de dois pesquisadores da lista de homenageados da Ordem Nacional do Mérito Científico. No sábado (6), outros 21 cientistas brasileiros, também em repúdio, comunicaram suas renúncias ao título.
Até a publicaçãoa assessoria de comunicação da Presidência, não explicou o motivo da exclusão dos nomes dos pesquisadores e aguarda respostas.
Os excluídos foram o cientista Marcus Vinícius Guimarães de Lacerda, da Fiocruz, que publicou a primeira pesquisa relatando a ineficácia da cloroquina no tratamento contra a Covid-19, e a cientista Adele Benzaken, atual diretora da Fiocruz Amazônia. Consultora da Organização Mundial da Saúde (OMS), ela é expoente na pesquisa contra o HIV/Aids. Então no governo, em 2019, Adele elaborou uma cartilha voltada para orientação e promoção da saúde de homens trans.
No documento assinado pelos professores da UFRJ, o grupo ressalta que os nomes presentes na condecoração foram indicados por uma comissão paritária de membros do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações, da Academia Brasileira de Ciências (ABC) e da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SPBC).
No manifesto emitido no domingo (7), o grupo classifica a atitude do governo federal como “indigna” e diz que mostra “falta de visão e desprezo pela ciência e pelo próprio desenvolvimento do país”.
Em outro protesto divulgado por cientistas no sábado (6), um dia após a publicação do decreto presidencial, os signatários também destacaram que não compactuavam com o que vinha sendo promovido pelo governo federal em relação a cortes para a ciência e tecnologia e o que chamaram de “perseguição a cientistas”. Em solidariedade aos dois cientistas excluídos, os 21 cientistas renunciaram ao título.
“Consideramos, portanto, gratificante nossa presença nessa lista, e somos extremamente honrados com a possibilidade de sermos agraciados com um dos maiores reconhecimentos que um cientista pode receber em nosso país. Entretanto, a homenagem oferecida por um governo federal que não apenas ignora a ciência, mas ativamente boicota as recomendações da epidemiologia e da saúde coletiva, não é condizente com nossas trajetórias científicas. Entretanto, em solidariedade aos colegas que foram sumariamente excluídos na lista de agraciados, e condizentes com nossa postura ética, renunciamos coletivamente a essa indicação”, diz a carta.
Em decreto de 3 de novembro, o Bolsonaro publicou a lista dos agraciados com a honraria de Ordem Nacional do Mérito Científico no Diário Oficial da União. Dois dias depois, houve a publicação do novo decreto excluindo os dois cientistas acima mencionados.
Leia a íntegra da carta dos professores da UFRJ:
Os Professores Eméritos da Universidade Federal do Rio de Janeiro, abaixo assinados, vêm a público expressar a sua indignação e repudiar a injusta exclusão dos cientistas Adele Schwartz Benzaken e Marcus Vinícius Guimarães de Lacerda da lista de agraciados com a Ordem Nacional do Mérito Científico. Os seus nomes foram indicados por uma comissão paritária de membros do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações, Academia Brasileira de Ciências (ABC) e Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SPBC), o que garante que sua escolha se dê em virtude de seu mérito científico, fora de toda e qualquer injunção política.
Em decreto de 3 de novembro de 2021, o atual ocupante do Palácio do Planalto publicou a lista dos agraciados com a honraria e, em 5 de novembro de 2021, o Presidente da República, surpreendentemente, fez publicar novo decreto excluindo os dois cientistas acima mencionados, por pura perseguição política.
Essa atitude indigna é marca de governos autoritários, condizente com o negacionismo do atual governo, que, durante a pandemia de Covid-19, se posicionou e agiu contra todas as recomendações científicas dos especialistas em saúde pública do país. Somado a isso, cortes financeiros abusivos vieram sufocar o financiamento de universidades e centros de pesquisa brasileiros, mostrando a sua total falta de visão e desprezo pela ciência e pelo próprio desenvolvimento do país.
Assim, prestamos nossa solidariedade aos cientistas Adele Schwartz Benzaken e Marcus Vinícius Guimarães de Lacerda, excluídos da lista de agraciados por motivos políticos, bem como aos 21 (vinte e um) cientistas que renunciaram coletivamente às suas indicações.
Estes 21 colegas deixaram muito claro que não se troca honradez por honrarias.
Rio de Janeiro, 6 de novembro de 2021
Adalberto Ramón Vieyra
Alda Judith Alves Mazzotti
Alice Rangel de Paiva Abreu
Ana Ivenicki
Anita Dolly Panek
Antônio Carlos Secchin
Antonio Flavio Barbosa Moreira
Antonio Giannella-Neto
Arthur Octavio de Ávila Kós
Basilio de Bragança Pereira
Erasmo Madureira Ferreira
Francisco Antônio de Moraes Accioli Dória
Francisco Radler de Aquino Neto
Gilberto Barbosa Domont
Helio dos Santos Migon
Henrique Murad
Jayme Luiz Szwarcfiter
João Luiz Maurity Saboia
Jose Mauro Peralta
Krishnaswamy Rajagopal
Liu Hsu
Luiz Davidovich
Luiz Felipe Alvahydo de Ulhoa Canto
Luiz Pereira Caloba
Luiz Pinguelli Rosa
Marcello André Barcinski
Márcio Tavares d’Amaral
Maria Angela Dias
Marieta de Moraes Ferreira
Mario Luiz Possas
Martin Schmal
Muniz Sodre Cabral
Nei Pereira Junior
Nelson Maculan Filho
Nelson Velho de Castro Faria
Nubia Verçosa Figueiredo
Otávio Guilherme Cardoso Alves Velho
Raquel Paiva de Araújo Soares
Ricardo de Andrade Medronho
Sandoval Carneiro Junior
Takeshi Kodama
Vivaldo Moura Neto
Walter Araujo Zin
Yvone Maggie de Leers Costa Ribeiro
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