Erika Januza: ela já ouviu muito “sai daqui, neguinha”Erika Januza: ela já ouviu muito “sai daqui, neguinha”
Há oito anos, Erika Januza chegava ao Rio para protagonizar uma série de TV. Na bagagem, além da realização de um sonho que mal sabia que tinha, muitas dúvidas, medos e uma timidez que luta até hoje para vencer. Escolhida num teste por Luiz Fernando Carvalho, a mineira de Contagem, em Minas Gerais, sequer imaginava a importância de uma produção cuja protagonista era uma mulher negra. Afinal, naquela época, as palavras empoderamento e representatividade não faziam parte do vocabulário do mundo. Mulher bonita para ela era Ana Hickmann, loira, alta, olhos claros e uma inegável aparência germânica. Era o que tinha no cardápio para Erika, que muitas vezes na vida ouviu (e obedeceu) a frase “Sai daqui, neguinha”.
“Não foi uma, não foram três. Foram várias. Eu era massacrada na escola, a neguinha magrela excluída. Eu não tinha uma referência, alguém para me espelhar. E, de repente, virei uma representante para alguém. Eu não fazia a menor ideia do quanto aquele lugar, naquele papel, era importante para os outros. Só fui entender isso bem mais tarde”, observa ela, que tinha Taís Araújo e Isabel Filardis como modelos de mulheres e profissionais que ela gostaria de ser um dia.
Erika Januza: empoderamento e representatividade contra o preconceito
Em busca de uma transformação pessoal, Erika decidiu que não seria mais uma gata borralheira à espera de uma mágica. A cor da pele, o que lhe tornava um alvo fácil, ela não podia trocar. Mas todo o resto, sim.
Descobriu a academia e deixou as duas calças jeans que usava para “encorpar” e passou a ter músculos. Conheceu o megahair e tratou de manter os cabelos lisos até a cintura. Passou a amar vestidos (peça preferida até hoje). Viu que levava jeito para
fotografar e decidiu ser modelo. “Cismei. Participei de todos os concursos de beleza que apareceram. Passei a gostar de mim, a me sentir bem comigo. Naquela época, minha autoestima era até maior do que a que tinha quando fiz meu primeiro papel”, reflete.
Descobriu a academia e deixou as duas calças jeans que usava para “encorpar” e passou a ter músculos. Conheceu o megahair e tratou de manter os cabelos lisos até a cintura. Passou a amar vestidos (peça preferida até hoje). Viu que levava jeito para
fotografar e decidiu ser modelo. “Cismei. Participei de todos os concursos de beleza que apareceram. Passei a gostar de mim, a me sentir bem comigo. Naquela época, minha autoestima era até maior do que a que tinha quando fiz meu primeiro papel”, reflete.
Drible no fracasso
A falta de autoconfiança aliada a tal timidez somada a poucos recursos financeiros por pouco não se tornaram a fórmula do fracasso de Erika. Ela já havia feito a primeira novela “Em família”, de 2014, fixado residência no Rio, e estava em desespero depois de meses sem trabalho quando encontrou Nando Cunha numa gravação: “Me abri com ele, disse que se não conseguisse trabalho, desistiria de tudo. Eu já não sabia se teria dinheiro para comer. Ele me indicou um coach, Rodolfo Santos. Era para termos dez sessões, disse que não tinha dinheiro para pagar e ele resolveu me ajudar. Digo que ele mudou minha vida. E não foi passando a mão na minha cabeça e tendo pena de mim. Ele me deu um chacoalhão”.
O que veio depois foram papéis que começaram pequenos e se tornaram grandes, passando por Julia, escrita para ela por Walther Negrão (”me emociono muito ao lembrar. Ele não sabe como sou grata por isso”), a juíza Raquel, de “O outro lado do paraíso”, e agora a tenista Marina, de “Amor de mãe”, que ficará rica e famosa. Um feito, para quem só queria ter a própria beleza reconhecida na adolescência.
Aos 35 anos, esta já não é uma questão. Aparentemente, Erika superou seus conflitos de aceitação. Bem como os sentimentais que já a fizeram, por exemplo, implorar para que um ex voltasse. Disso, tirou uma lição: manter o particular cada vez mais longe do público. Namorando o grafiteiro e artista plástico Juan Nakamura, de 21 anos, filho da também atriz e bailarina Carol Nakamura, Erika ainda não se sente confortável para falar da relação. “Nunca mencionei nada sobre a gente antes. Não defini isso. É uma coisa minha, nossa. Apesar de ter uma vida pública, de estar nas redes sociais, prefiro deixar pelo menos essa parte de fora, para manter minha privacidade”, justifica.
É nas redes sociais que Erika percebe o quanto sua imagem hoje faz diferença; Notou claramente quando tosou os cabelos. “Foi libertador. Para mim e para as mulheres que tomaram essa coragem. Recebi tantas mensagens positivas, que jamais imaginei estar criando de maneira involuntária um movimento”, orgulha-se.
O movimento, como tudo o que acontece no ambiente digital, também trouxe à tona o preconceito que Erika conhece tão bem. Ela chegou a denunciar um perfil que lhe dirigia ofensas por conta de sua aparência. “Tomei uma atitude para que nenhum negro ou negra sejam chamados de macaco ou ofendidos por sua pele e raça. Foi comigo. Mas me dói do mesmo jeito ver acontecendo com o outro”, pondera.
Sonho de princesa
O mesmo tipo de reação, ela já tinha sentido quando participou da “Dança dos Famosos”, na qual chegou à final. A ofendiam de todas as maneiras possíveis em emails compridos que chegavam logo no dia seguinte a uma apresentação. Erika chorou, se magoou, xingou, se questionou... O sentimento de inferioridade, incutido diante de mais um de tantos episódios de racismo pelos quais passou, só foi substituído quando a atriz se apresentou dançando uma valsa, a bordo de um vestido cor-de-rosa, rodado e bordado. “Me senti uma princesa. A princesa que não existe na infância de uma menina negra. A princesa com um final feliz. A princesa que um dia vai dar uma entrevista em que o racismo não seja mencionado, porque ele não vai mais existir e que seremos todos iguais, indistintamente”, analisa. Parece que a gata borralheira finalmente encontrou a Cinderela que existia dentro dela.
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