Vice-presidente afirma que houve redução de 7,6% das queimadas de maio a julho, mas dados oficiais mostram aumento de 22,7% no período.
Em artigo publicado nesta quarta-feira (19/8) no jornal Correio Braziliense, o vice-presidente Hamilton Mourão, que coordena o Conselho Nacional da Amazônia Legal, divulgou informações falsas sobre queimadas na Amazônia. Verificamos as afirmações. Veja a seguir:
“Atividades em curso, como a Operação Verde Brasil 2 e o decreto de moratória do fogo, que proíbe as queimadas legais na Amazônia por 120 dias, ressalvadas as praticadas pelas populações tradicionais para abrirem roçados, contribuíram para a redução de 7,6% das queimadas no período de 1.º de maio a 31 de julho deste ano. Em julho de 2020 houve 6.800 focos de calor, pouco acima da média histórica, que é 6.400.”
FALSO
A afirmação de que houve “redução de 7,6% das queimadas no período de 1.º de maio a 31 de julho deste ano” é falsa. Dados oficiais do Inpe mostram que houve aumento de 22,7% das queimadas no período mencionado pelo general. De maio a julho de 2020 foram registrados 9.880 focos de calor no bioma Amazônia, contra 8.052 no mesmo período do ano anterior. Os três meses destacados por Mourão no artigo “Vamos falar de queimadas” coincidem com a participação das Forças Armadas em ações de combate ao desmatamento na Amazônia, que desde 11 de maio são coordenadas pelo Ministério da Defesa.
Também está imprecisa a informação de que a média histórica de focos de calor para o mês de julho seria de 6.400, mais próxima dos 6.803 focos registrados em julho de 2020. A média histórica para o mês é de 6.243, segundo os dados oficiais.
“Além de queimadas, há os incêndios criminosos e os que ocorrem de forma natural, especialmente no verão amazônico, tendo em vista o clima e a vegetação mais secos.”
MEIA-VERDADE
Na Amazônia, as queimadas são causadas predominantemente pela ação humana. O fogo com ignição natural, como um raio, em um ecossistema tão úmido como a floresta amazônica é extremamente raro – estima-se que aconteça somente a cada 500 anos ou mais, aponta o Ipam nesta nota técnica.
“O uso de balões de São João, fogueiras e queima de lixo também preocupam, pois o vento espalha fagulhas e novamente perdemos o controle.”
INVERIFICÁVEL
O vice-presidente escreveu 831 palavras no artigo. Sem citar uma única vez o desmatamento, ele atribui parte das queimadas na Amazônia ao uso de balões. Soltar balões é um crime que pode causar graves problemas, mas esta não é uma prática comum na Amazônia, especialmente na zona rural. Portanto, não há evidências de que seja causa de queimadas na floresta amazônica.
A variação do número de queimadas na Amazônia é explicada principalmente por dois fatores: desmatamento, por aumentar a quantidade de biomassa disponível para queima, e seca, por reduzir a umidade e propiciar condições para o fogo.
Nos últimos 22 anos, desde que se iniciou a série histórica do Inpe de monitoramento de queimadas, todos os anos de recorde de fogo (mais de 150 mil focos) também foram anos de recorde de desmatamento – exceto 2007, ano em que houve uma seca tão forte que, mesmo com o desmate em queda, as queimadas explodiram.
Estudo do Ipam mostra que o fogo em áreas recém-desmatadas da Amazônia e os incêndios florestais representaram 64% dos focos de calor registrados na região em 2019.
Em 2020, 50% das queimadas registradas até junho foram diretamente causadas por desmatamento, aponta o Inpe em nota técnica. No documento, os pesquisadores alertam: “É evidente que a intensificação do processo de desmatamento, observado este ano, resultará diretamente em mais eventos de queimadas na Amazônia em 2020.”
A correlação entre fogo e desmatamento é alta porque o desmatamento é um bom indicador do aquecimento da atividade rural. Nos anos em que há melhores expectativas no mercado de commodities agrícolas e/ou redução das medidas de controle, ocorre mais abertura de áreas para produção, e o fogo é usado para eliminar restos da vegetação cortada. Em 2019 esse movimento ocorreu: os dez municípios mais desmatados da Amazônia também foram os dez mais queimados até agosto, segundo o Ipam. O fogo também é usado para limpeza de áreas de pastagens ou áreas de agricultura já estabelecidas.
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