Ana Carolina Andrade, aprovada para especialização em comunicação como parda, negou må-fé ou fraude: "Minha autodeclaração foi sincera"(foto: Ramon Lisboa/EM/DA Press) |
ApĂłs ter sido alvo de crĂticas e ofensas na internet por se autodeclarar parda para concorrer a uma vaga no curso de mestrado em comunicação da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), a professora de projetos sociais graduada em comunicação Ana Carolina Andrade, de 27 anos, reconheceu que errou ao usar a polĂtica de cotas. Em sua pĂĄgina no Facebook, ela publicou uma carta aberta em que divulga novo posicionamento sobre o caso: “ConcluĂ que fiz mau uso das cotas. NĂŁo por querer me beneficiar de direitos de outros, mas por uma mĂĄ compreensĂŁo dos usos das cotas raciais. A minha autodeclaração foi sincera, mas nĂŁo existe coerĂȘncia em eu optar pela inscrição como cotista. NĂŁo cometi uma fraude, cometi um erro”, disse Ana Carolina.
Para chegar a essa conclusão, a professora disse ter pesquisado e conversado com representantes de movimentos negros, estudantes de açÔes afirmativas e mulheres negras até entender que ela não se enquadra nos critérios da lei. Isso porque, segundo Ana Carolina, as cotas buscam aumentar a representatividade dos negros declarados nas universidades e, para preencher esse requisito, ela teria que ser reconhecida como negra.
“Isso nĂŁo significa que basta eu nĂŁo ser branca para poder utilizĂĄ-las. Ă necessĂĄrio que eu represente os negros, Ă© necessĂĄrio que eu seja negra. Ă uma questĂŁo simbĂłlica, de representação. Se eu nĂŁo sou identificada como negra, nĂŁo serei uma acadĂȘmica negra, nunca serei reconhecida como uma professora negra, porque as pessoas olham para mim e nĂŁo me veem como negra”, disse a professora. E reforça: “A questĂŁo da imagem Ă© fundamental, porque vai muito alĂ©m do ‘pagamento de uma dĂvida’ ou de ‘uma compensação’ pelos crimes de racismo praticados histĂłrica e cotidianamente por brasileiros”, sustentou.
O caso veio a pĂșblico em 24 de novembro, depois de uma postagem de Ana Carolina no Facebook comemorando a aprovação no mestrado. De imediato vieram as crĂticas nas redes sociais e a professora foi denunciada por integrantes do movimento negro e estudantes da UFMG por suposta fraude. Como resposta, a jovem se defendeu e citou a sua herança familiar como fator decisivo para ingressar no processo seletivo do sistema de cotas como parda. “A minha tataravĂł era escrava. Ela morava na casa dos patrĂ”es. NĂŁo precisava pagar comida nem contas. Depois que saiu de lĂĄ, passou a ter que arcar com esses gastos, mesmo nĂŁo estando preparada e inserida no mercado de trabalho. Acredito que o passado da minha famĂlia influencia a minha geração”, disse.
Mesmo reconhecendo o erro, a professora mantĂ©m a expectativa de poder se matricular no curso, previsto para começar em março. “Gostaria que este erro pudesse ser corrigido da melhor forma possĂvel, sem implicar minha exclusĂŁo do processo seletivo”, disse, reforçando ainda que espera levar o tema para o debate pĂșblico de forma que possa contribuir para futuros esclarecimentos, consolidação e legitimação das cotas raciais na universidade. Ela ainda fez um desabafo, dizendo que o todo o processo de xingamentos na internet e de entendimento sobre as lei de cotas foi muito complexo, difĂcil. “NĂŁo garanto que serĂĄ compreensĂvel a todos, mas jĂĄ Ă© o suficiente para pensarmos em sempre desconstruir as certezas e nos abrir Ă s discussĂ”es de todos os lados”.
APURAĂĂO A UFMG informou que apura a denĂșncia do suposto uso irregular de sua polĂtica de cotas. Sobre o novo posicionamento da estudante, a universidade afirmou que ela precisa formalizĂĄ-lo junto ao colegiado da pĂłs-graduação da Faculdade de Filosofia e CiĂȘncias Humanas (Fafich). O MinistĂ©rio PĂșblico de Minas Gerais (MPMG) recebeu a denĂșncia sobre o caso e ficou de repassĂĄ-la ao MinistĂ©rio PĂșblico Federal (MPF), o que ainda nĂŁo havia ocorrido atĂ© o inĂcio da tarde de ontem.
Nota de Ana Carolina:
NOTA ABERTA A SOCIEDADE E COMUNIDADE ACADĂMICA
A respeito das Ășltimas matĂ©rias que saĂram na imprensa sobre o processo seletivo do Mestrado da UFMG, envolvendo acusaçÔes de fraude nas cotas raciais, declaro:
Entender para quem sĂŁo as cotas raciais Ă© um desafio muito coplexo, apesar de muitos acharem Ăłbvio. Passei por dias muito produtivos na busca de conhecimento para me posicionar sobre o assunto e venho compartilhar os aprendizados em busca de estender o debate sobre as cotas raciais.
Eu sempre me declarei parda, nunca me vi como branca. Desde o surgimento das cotas me achei inclusa, pois sou parda, afrodescendente, de famĂlia negra. Antes de me declarar tomei um cuidado de pesquisar a legitimidade da minha declaração, mas pequei em buscar as respostas apenas na legislação e em publicaçÔes do governo, que sugerem a abrangĂȘncia de todos os declarados pardos e pretos. Para mim, as cotas tinham a função de buscar uma equidade social que sempre foi negada aos negros mesmo apĂłs o fim da escravidĂŁo. E que eu, por ser criada e sustentada por famĂlia negra, por saber de onde eu vim, da minha trajetĂłria, das minhas relaçÔes e tratamentos que recebi e da forma como sempre me declarei, nĂŁo tinha dĂșvida nenhuma quanto a isso. Eu garanto que se eu, que me formei na FAFICH, tinha essa concepção sobre as cotas raciais, ela Ă© muito, muito mais comum do que se imagina. A polĂtica Ă© nacional, e em todas as cidades, todos os cantos do paĂs, a informação amplamente acessĂvel Ă© de que pardos e pretos estĂŁo inclusos em cotas raciais. A quantidade de pessoas bem informadas sobre o uso e a função das cotas no Brasil Ă© muito pequena, mĂnima.
O Mestrado da Comunicação abriu 12 vagas, quase 50% das vagas, para Afrodescendentes. Apenas 11 inscritos optaram pelas cotas. Todas as fases do Processo Seletivo sĂŁo eliminatĂłrias, existe uma nota mĂnima para passar para a prĂłxima fase, independente das cotas. Apenas 2 candidatas cotistas chegaram Ă classificação, eu e mais uma. A comissĂŁo aceitou a minha carta, e a banca me aceitou da forma como eu me declarava. Acredito que, se Ă© difĂcil optar pela declaração, mais difĂcil ainda deve ser contestĂĄ-la.
ApĂłs o processo seletivo, algumas pessoas se sentiram incomodadas com o fato de eu ser cotista por nĂŁo me considerarem negra. Apareceram manifestaçÔes de insatisfação violentas, agressivas e raivosas, de pessoas que nĂŁo me conheciam. Algumas pessoas integrantes do meu facebook viram as agressĂ”es e tentaram me defender, em um gesto de proteção, de cuidado, com tanta agressividade. De repente sumi atrĂĄs de uma imagem construĂda no facebook, que Ă© a soma daquilo que sou acusada com caracterĂsticas negativas identificadas nas pessoas que tentaram me defender. Foram realizadas denĂșncias de fraude Ă mĂdia, envolvendo minha histĂłria e a universidade, e respondi as perguntas dos jornais com toda a sinceridade sobre qual era a minha concepção sobre as cotas. Com a repercussĂŁo na mĂdia os ataques no facebook se multiplicaram, e se somaram a manifestaçÔes de tristeza por pessoas que se sentiram prejudicadas com a minha atitude, e conheciam apenas a minha imagem construĂda nessa situação. A experiĂȘncia foi bem intensa, mas de nem todo negativa. Levar o debate para a mĂdia significa tirar ele de um ambiente online complexo que ainda nĂŁo consigo compreender, nĂŁo sei como utilizar, e trazer para o debate pĂșblico. Compreendi que alĂ©m de aprender sobre o real uso das cotas, eu teria um espaço para documentar e compartilhar este aprendizado, que trata de um assunto delicado e muito pouco inteligĂvel. Enriquecer a discussĂŁo sobre as cotas significa reforçar a sua importĂąncia. Dialogar Ă© importante. Contribuir para a formação das pessoas. Trabalhar para o desenvolvimento de um pensamento, de uma causa, Ă© trabalhar para o desenvolvimento do outro, em todas as instĂąncias.
Lendo os comentĂĄrios no Facebook nĂŁo consegui tirar nada de produtivo que enriquecesse a minha percepção. Telefonei para diversas pessoas que manifestaram sua insatisfação no Facebook, conversei com pessoas que dominam o assunto mais do que eu, procurei pessoas estudiosas de movimentos negros e de açÔes afirmativas. Existe uma deficiĂȘncia na formação para o tema das cotas em todos os cursos da FAFICH, e as principais fontes de informaçÔes sĂŁo as comunicaçÔes de ativistas sociais da sociedade civil e alguns estudiosos. Fui a fundo, de indicação para indicação, li os textos e assisti aos vĂdeos indicados atĂ© eu conseguir concluir algo que jĂĄ possa compartilhar. Foi muito complexo, muito difĂcil, portanto nĂŁo garanto que serĂĄ compreensĂvel a todos, mas jĂĄ Ă© o suficiente para pensarmos em sempre desconstruir as certezas e nos abrirmos Ă s discussĂ”es, de todos os lados. Se cada concepção Ă© manifestada como Ăłbvia e elas sĂŁo diferentes entre si, logicamente a conclusĂŁo nĂŁo pode ser Ăłbvia. NĂŁo Ă© Ăłbvio para mim, para a banca, para outros estudantes, para Cientistas Sociais, para alguns negros, para quase nenhum pardo que conheço. Entre todas as funcionalidades das cotas discutidas vou falar sobre a que mais cabe ao meu caso, a mais significativa. Talvez desordenadas e imaturas, mas fruto de muita busca, aĂ vĂŁo as minhas conclusĂ”es:
As cotas sĂŁo uma ferramenta para aumentar a representatividade dos negros na universidade. Isso NĂO significa que basta eu nĂŁo ser branca para poder utilizĂĄ-las. Ă necessĂĄrio que eu represente os negros, Ă© necessĂĄrio que eu seja negra. Ă uma questĂŁo simbĂłlica, de representação. Se eu nĂŁo sou identificada como negra, nĂŁo serei uma acadĂȘmica negra, nunca serei reconhecida como uma professora negra, porque as pessoas olham para mim e nĂŁo me vĂȘm como negra. Entendi essa questĂŁo da imagem como fundamental, porque vai muito alĂ©m do “pagamento de uma dĂvida” ou de “uma compensação” pelos crimes de racismo praticados historicamente e cotidianamente por brasileiros. Entendi que eu nĂŁo preciso ser branca para nĂŁo me declarar. Eu posso ser parda, morena, mestiça, mas se eu nĂŁo sou vista como uma negra, eu nĂŁo tenho legitimidade para representar os negros. Entretanto, se a cor da pele Ă© clara mas as caracterĂsticas fĂsicas representam o negro, cabe a autodeclaração. NĂŁo Ă© necessĂĄrio um aprofundamento nas questĂ”es raciais relacionadas Ă s classes sociais, pois este limite Ă© tĂȘnue e perigoso, e nĂŁo altera a questĂŁo da representação, dos negros estarem presentes hoje na universidade. As cotas raciais tĂȘm tambĂ©m este objetivo, que Ă© importante para a formação de um ambiente representado pelas diversidades, o que engrandece a experiĂȘncia de toda a comunidade acadĂȘmica e fortalece a luta contra o racismo no imaginĂĄrio social.
ConcluĂ que fiz mal uso das cotas. NĂŁo por querer me beneficiar de direitos de outros, mas por uma mĂĄ compreensĂŁo dos usos das cotas raciais. A minha autodeclaração foi sincera, mas nĂŁo existe coerĂȘncia em eu optar pela inscrição como cotista. NĂŁo cometi uma fraude, cometi um erro. Gostaria que este erro pudesse ser corrigido da melhor forma possĂvel, sem implicar na minha exclusĂŁo do processo seletivo. Pretendo explorar a fundo a possibilidade de levar este debate ao espaço pĂșblico e contribuir para futuros esclarecimentos e para a consolidação e legitimação das cotas raciais na universidade.
A respeito das Ășltimas matĂ©rias que saĂram na imprensa sobre o processo seletivo do Mestrado da UFMG, envolvendo acusaçÔes de fraude nas cotas raciais, declaro:
Entender para quem sĂŁo as cotas raciais Ă© um desafio muito coplexo, apesar de muitos acharem Ăłbvio. Passei por dias muito produtivos na busca de conhecimento para me posicionar sobre o assunto e venho compartilhar os aprendizados em busca de estender o debate sobre as cotas raciais.
Eu sempre me declarei parda, nunca me vi como branca. Desde o surgimento das cotas me achei inclusa, pois sou parda, afrodescendente, de famĂlia negra. Antes de me declarar tomei um cuidado de pesquisar a legitimidade da minha declaração, mas pequei em buscar as respostas apenas na legislação e em publicaçÔes do governo, que sugerem a abrangĂȘncia de todos os declarados pardos e pretos. Para mim, as cotas tinham a função de buscar uma equidade social que sempre foi negada aos negros mesmo apĂłs o fim da escravidĂŁo. E que eu, por ser criada e sustentada por famĂlia negra, por saber de onde eu vim, da minha trajetĂłria, das minhas relaçÔes e tratamentos que recebi e da forma como sempre me declarei, nĂŁo tinha dĂșvida nenhuma quanto a isso. Eu garanto que se eu, que me formei na FAFICH, tinha essa concepção sobre as cotas raciais, ela Ă© muito, muito mais comum do que se imagina. A polĂtica Ă© nacional, e em todas as cidades, todos os cantos do paĂs, a informação amplamente acessĂvel Ă© de que pardos e pretos estĂŁo inclusos em cotas raciais. A quantidade de pessoas bem informadas sobre o uso e a função das cotas no Brasil Ă© muito pequena, mĂnima.
O Mestrado da Comunicação abriu 12 vagas, quase 50% das vagas, para Afrodescendentes. Apenas 11 inscritos optaram pelas cotas. Todas as fases do Processo Seletivo sĂŁo eliminatĂłrias, existe uma nota mĂnima para passar para a prĂłxima fase, independente das cotas. Apenas 2 candidatas cotistas chegaram Ă classificação, eu e mais uma. A comissĂŁo aceitou a minha carta, e a banca me aceitou da forma como eu me declarava. Acredito que, se Ă© difĂcil optar pela declaração, mais difĂcil ainda deve ser contestĂĄ-la.
ApĂłs o processo seletivo, algumas pessoas se sentiram incomodadas com o fato de eu ser cotista por nĂŁo me considerarem negra. Apareceram manifestaçÔes de insatisfação violentas, agressivas e raivosas, de pessoas que nĂŁo me conheciam. Algumas pessoas integrantes do meu facebook viram as agressĂ”es e tentaram me defender, em um gesto de proteção, de cuidado, com tanta agressividade. De repente sumi atrĂĄs de uma imagem construĂda no facebook, que Ă© a soma daquilo que sou acusada com caracterĂsticas negativas identificadas nas pessoas que tentaram me defender. Foram realizadas denĂșncias de fraude Ă mĂdia, envolvendo minha histĂłria e a universidade, e respondi as perguntas dos jornais com toda a sinceridade sobre qual era a minha concepção sobre as cotas. Com a repercussĂŁo na mĂdia os ataques no facebook se multiplicaram, e se somaram a manifestaçÔes de tristeza por pessoas que se sentiram prejudicadas com a minha atitude, e conheciam apenas a minha imagem construĂda nessa situação. A experiĂȘncia foi bem intensa, mas de nem todo negativa. Levar o debate para a mĂdia significa tirar ele de um ambiente online complexo que ainda nĂŁo consigo compreender, nĂŁo sei como utilizar, e trazer para o debate pĂșblico. Compreendi que alĂ©m de aprender sobre o real uso das cotas, eu teria um espaço para documentar e compartilhar este aprendizado, que trata de um assunto delicado e muito pouco inteligĂvel. Enriquecer a discussĂŁo sobre as cotas significa reforçar a sua importĂąncia. Dialogar Ă© importante. Contribuir para a formação das pessoas. Trabalhar para o desenvolvimento de um pensamento, de uma causa, Ă© trabalhar para o desenvolvimento do outro, em todas as instĂąncias.
Lendo os comentĂĄrios no Facebook nĂŁo consegui tirar nada de produtivo que enriquecesse a minha percepção. Telefonei para diversas pessoas que manifestaram sua insatisfação no Facebook, conversei com pessoas que dominam o assunto mais do que eu, procurei pessoas estudiosas de movimentos negros e de açÔes afirmativas. Existe uma deficiĂȘncia na formação para o tema das cotas em todos os cursos da FAFICH, e as principais fontes de informaçÔes sĂŁo as comunicaçÔes de ativistas sociais da sociedade civil e alguns estudiosos. Fui a fundo, de indicação para indicação, li os textos e assisti aos vĂdeos indicados atĂ© eu conseguir concluir algo que jĂĄ possa compartilhar. Foi muito complexo, muito difĂcil, portanto nĂŁo garanto que serĂĄ compreensĂvel a todos, mas jĂĄ Ă© o suficiente para pensarmos em sempre desconstruir as certezas e nos abrirmos Ă s discussĂ”es, de todos os lados. Se cada concepção Ă© manifestada como Ăłbvia e elas sĂŁo diferentes entre si, logicamente a conclusĂŁo nĂŁo pode ser Ăłbvia. NĂŁo Ă© Ăłbvio para mim, para a banca, para outros estudantes, para Cientistas Sociais, para alguns negros, para quase nenhum pardo que conheço. Entre todas as funcionalidades das cotas discutidas vou falar sobre a que mais cabe ao meu caso, a mais significativa. Talvez desordenadas e imaturas, mas fruto de muita busca, aĂ vĂŁo as minhas conclusĂ”es:
As cotas sĂŁo uma ferramenta para aumentar a representatividade dos negros na universidade. Isso NĂO significa que basta eu nĂŁo ser branca para poder utilizĂĄ-las. Ă necessĂĄrio que eu represente os negros, Ă© necessĂĄrio que eu seja negra. Ă uma questĂŁo simbĂłlica, de representação. Se eu nĂŁo sou identificada como negra, nĂŁo serei uma acadĂȘmica negra, nunca serei reconhecida como uma professora negra, porque as pessoas olham para mim e nĂŁo me vĂȘm como negra. Entendi essa questĂŁo da imagem como fundamental, porque vai muito alĂ©m do “pagamento de uma dĂvida” ou de “uma compensação” pelos crimes de racismo praticados historicamente e cotidianamente por brasileiros. Entendi que eu nĂŁo preciso ser branca para nĂŁo me declarar. Eu posso ser parda, morena, mestiça, mas se eu nĂŁo sou vista como uma negra, eu nĂŁo tenho legitimidade para representar os negros. Entretanto, se a cor da pele Ă© clara mas as caracterĂsticas fĂsicas representam o negro, cabe a autodeclaração. NĂŁo Ă© necessĂĄrio um aprofundamento nas questĂ”es raciais relacionadas Ă s classes sociais, pois este limite Ă© tĂȘnue e perigoso, e nĂŁo altera a questĂŁo da representação, dos negros estarem presentes hoje na universidade. As cotas raciais tĂȘm tambĂ©m este objetivo, que Ă© importante para a formação de um ambiente representado pelas diversidades, o que engrandece a experiĂȘncia de toda a comunidade acadĂȘmica e fortalece a luta contra o racismo no imaginĂĄrio social.
ConcluĂ que fiz mal uso das cotas. NĂŁo por querer me beneficiar de direitos de outros, mas por uma mĂĄ compreensĂŁo dos usos das cotas raciais. A minha autodeclaração foi sincera, mas nĂŁo existe coerĂȘncia em eu optar pela inscrição como cotista. NĂŁo cometi uma fraude, cometi um erro. Gostaria que este erro pudesse ser corrigido da melhor forma possĂvel, sem implicar na minha exclusĂŁo do processo seletivo. Pretendo explorar a fundo a possibilidade de levar este debate ao espaço pĂșblico e contribuir para futuros esclarecimentos e para a consolidação e legitimação das cotas raciais na universidade.
26/11/2017
Ana Carolina Andrade
Ana Carolina Andrade
A partir desta declaração espero que os ataques se encerrem. Não aceito mais ser chamada de "branca" e nem de "oportunista". Que se encerrem as afirmaçÔes falsas e qualquer tipo de declaração sem provas que afete negativamente minha imagem pessoal e profissional. Me coloco a disposição para diålogos e contribuiçÔes sobre o tema.
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