Após as delações dos executivos da construtora Odebrecht que envolveram 415 políticos de 26 partidos e abalaram Brasília ao revelar esquemas para repasses de dinheiro para campanhas eleitorais, outras empresas e nomes de peso do cenário político podem entrar na fila para revelar detalhes sobre desvios de recursos públicos. Desde janeiro, a empreiteira Andrade Gutierrez negocia nova delação para complementar as informações repassadas ao Ministério Público no ano passado sobre desvios de recursos em obras públicas.
Outras empresas envolvidas na Operação Lava-Jato, como OAS e Camargo Corrêa, também podem fechar acordos de colaboração. Alguns protagonistas nos escândalos que já estão atrás das grades, como o ex-deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) e o ex-governador do Rio Sérgio Cabral (PMDB-RJ), além do empresário Eike Batista, já deram indicações de que podem fazer delações para reduzir o tempo de prisão.
Para políticos que receberam verbas por meio de caixa 2 ou propinas em troca de apoio em votações no Congresso, a situação pode ficar ainda pior com novas delações. Em 2015, os executivos da Camargo Corrêa formalizaram colaboração com os investigadores e no ano passado foi a vez dos executivos da Andrade Gutierrez, que no acordo aceitaram devolver R$ 1 bilhão aos cofres públicos. Com revelações recentes após os depoimentos da Odebrecht, promotores verificaram a necessidade de ouvir novamente os principais nomes das duas empreiteiras, uma espécie de “recall” das delações anteriores.
As duas empresas foram informadas pelo Ministério Público quer precisariam passar por uma revisão em suas colaborações, uma vez que surgiram inconsistências ou foram detectadas lacunas de informações após a entrega dos anexos da Odebrecht. Executivos deverão explicar pontos não esclarecidos em suas próprias delações.
Governo Entre os políticos já presos que já demonstraram interesse em fazer acordo de delação, o nome que pode causar mais problemas para o governo Michel Temer é do ex-presidente da Câmara Eduado Cunha. Preso desde outubro, Cunha mandou vários recados para o Palácio do Planalto por meio de parlamentares aliados. Apesar de a defesa do ex-deputado afirmar que ele não está próximo de fechar o acordo, Cunha tem se mostrado cada vez mais insatisfeito com a falta de apoio de ex-aliados após ter o pedido de liberdade negado pelo Supremo Tribunal Federal.
Em processo em que é investigado na Justiça Federal do Paraná, Cunha fez várias perguntas constrangedoras direcionadas a Temer. Ele questiona a relação de Temer com alguns executivos de empreiteiras, empresário presos e cita obras com suspeitas de desvios de recursos públicos. O juiz Sérgio Moro alertou que o objetivo do réu era claramente ameaçar de forma velada o presidente da República e vetou a inclusão das perguntas no processo.
BANGU
Preso no complexo penitenciário de Bangu desde novembro, o ex-governador do Rio de Janeiro Sérgio Cabral é outro nome de peso do mundo político que busca nos acordos com o Ministério Público uma forma de reduzir sua pena atrás das grades. Ele afirmou a interlocutores que sabe que tem poucas chances de se livrar do longo tempo de prisão, uma vez que tem contra si três mandados de prisão (dois expedidos pelo juiz Marcelo Bretas, no Rio de Janeiro, e um pelo juiz Sérgio Moro, no Paraná). Por isso estuda algum tipo de acordo.
Cabral teria se comprometido a falar sobre pelo menos 97 casos de corrupção e outros crimes ligados ao governo fluminense, na Assembleia Legislativa do Rio, no Tribunal de Justiça, no próprio Ministério Público e até mesmo no Superior Tribunal de Justiça (STJ). Também detido em Bangu, o empresário Eike Batista também já demonstrou interesse em delatar e estaria negociando um acordo de delação com o MP do Rio.
Acusações contra 415 políticos e 26 partidos
As delações de executivos e ex-executivos da Odebrecht envolveram pelo menos 415 políticos de 26 dos 35 partidos legalmente registrados no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). O PT lidera a lista com o maior número de filiados atingidos (ao todo, 93 petistas foram citados nos depoimentos). O partido é seguido de perto pelos integrantes das duas principais legendas que dão sustentação ao governo Temer: PSDB e PMDB. Cada um tem 77 membros citados pelos delatores.
PT, PMDB e PSDB são os três maiores partidos do Congresso e representam as três mais importantes elites partidárias do país. Juntos, eles concentram 59,5% dos políticos enredados nas delações da maior empreiteira brasileira, segundo levantamento em todas as 337 petições com pedidos de investigação feitas pelo procurador-geral de Justiça, Rodrigo Janot, e encaminhadas ao ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF).
A questão não é apenas quantitativa. Os relatos dos delatores envolveram as principais lideranças desses partidos (são citados o presidente Michel Temer e cinco ex-presidentes (José Sarney, Fernando Collor, Fernando Henrique Cardoso, Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff), ainda que com grau, intensidade e número de vezes diferentes. Além deles, aparecem ex-candidatos à Presidência, como os senadores José Serra (PSDB-SP), Aécio Neves (PSDB-MG), o governador Geraldo Alckmin (PSDB-SP), o ex-governador Eduardo Campos (PSB-PE), o pastor Everaldo (PSC-RJ), José Maria Eymael (PSDC-SP), o ex-governador Leonel Brizola (PDT-RJ) e o deputado federal Paulo Maluf (PP-SP). No caso desses dois últimos, a acusação foi arquivada pelo STF. A maioria teve lugar de destaque nas corridas presidenciais desde a redemocratização do país, em 1985.
Ex-ministros No PT, as delações atingiram os ex-ministros Jaques Wagner, Guido Mantega, Antonio Palocci, José Dirceu e Paulo Bernardo e os governadores Tião Viana (AC) e Fernando Pimentel (MG). No PMDB, foram delatados o presidente do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE), e os senadores Renan Calheiros (AL) e Romero Jucá (RR), o ex-governador Sérgio Cabral (RJ) e os governadores Luiz Fernando Pezão (RJ) e Paulo Hartung (ES).
Os partidos médios, muitos dos quais compõem a base de Temer, também tiveram lideranças envolvidas. O PP é a quarta sigla mais afetada, com 35 citados, incluindo seu presidente, o senador Ciro Nogueira (PI). O DEM vem a seguir, com 22 denunciados, entre eles o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (RJ). PSB (19), PSD (15), PTB (11), PR e PCdoB, com 10, PPS (9), e PDT (8) completam a lista. Destes, só o PCdoB e o PDT não estão no governo. Entre os pequenos partidos sobram 25 citados. Só dois (PSOL e PTN) não apoiam Temer. Todos os políticos até agora citados negaram o conteúdo das delações.
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